Reconstituição Histórico-documental da Vida do FC Porto em parcelas memoráveis

Reconstituição histórico-documental da Vida do FC Porto em parcelas memoráveis

Criar é fazer existir, dar vida. Recriar é reconstituir. Como a criação e existência deste blogue tende a que tenha vida perene tudo o que eleva a alma portista. E ao recriar-se memórias procuramos fazer algo para que se não esqueça a história, procurando que seja reavivado o facto de terem existido valores memorávais dignos de registo; tal como se cumpra a finalidade de obtenção glorificadora, que levou a haver pessoas vencedoras, campeões conquistadores de justas vitórias, quais acontecimentos merecedores de evocação histórica.

A. P.

sexta-feira, 15 de abril de 2016

“Capitão-Comandante” / General João Sarmento Pimentel : Um ilustre portista entre personagens históricos da Grei


O fenómeno social que se revela no caso do desporto, como facto de atração e profuso elo de ligação com os mais diversos campos da sociedade, é também generoso em conexão com curiosidades de relação portista, como no tema que desta vez trazemos à ampliação memorial. Tal o caso dum histórico personagem dos anais da história portuguesa do século XX, que teve também simpatia pelo clube da cidade Invicta, a capital da Liberdade que foi sempre sua. Vindo a talhe evocar a figura lendária do “Comandante” João Sarmento Pimentel, homem que recebeu a espada de honra da cidade do Porto e, apesar de constar na toponímia de diversas cidades e vilas, como por exemplo Leça da Palmeira, Matosinhos, Mirandela, Felgueiras, Arrentela e Corroios-Seixal, Vila Franca de Xira, e na freguesia de Rande (Felgueiras) onde viveu durante anos, etc, não tem na cidade do Porto qualquer rua com seu nome e a própria espada que ele depois ofereceu para o antigo museu da cidade portuense nem consta de relações identificativas dos roteiros de museus e outras publicações que tais…

(Nalgumas das mesmas localidades e diferentes também - frise-se, para evitar confusões - há outras ruas com nomes toponímicos de seu irmão, esse natural de Rande-Felgueiras, o aviador Francisco Sarmento Pimentel, autor da 1ª travessia aérea de Portugal à Índia, em 1930.)

= [Retrato de] João Maria Ferreira Sarmento Pimentel, in Vultos da Exposição Histórica da Ocupação: retratos de figuras de campanhas coloniais do séc. XIX e princípios do séc. XX. Organizada pelo Ministério das Colónias, no Pavilhão do Parque Eduardo VII, Lisboa, em 1937 / Instituto de Investigação Científica Tropical - Fundo Agência Geral do Ultramar - Arquivo Histórico Ultramarino  =

Refere-se assim este perfil, de honrado português antigo, pela aura que o distingue, sem olhar a quadrantes políticos nem simpatias sociais, num tempo como agora que praticamente não há grandes diferenças ideológicas, tal o estado político-social a que chegou o país, pois os atuais partidos políticos com assentos em lugares públicos se diferenciam mais nos nomes que no resto de interesse geral. Sendo assim referenciado João Sarmento Pimentel, que foi um lutador pela liberdade à luz de antigamente, aqui por nós lembrado apenas como pessoa que admiramos, por quanto teve alguma relação com o interesse portista.

Como enquadramento, anote-se uma breve referência biográfica:

João Maria Ferreira Sarmento Pimentel (n. Eixes, Mirandela-Portugal, 14 de Dezembro de 1888 — f. São Paulo-Brasil, 13 de Outubro de 1987) foi um oficial de Cavalaria do Exército Português, escritor e político que se distinguiu na luta contra a Monarquia e posterior Ditadura desde o 28 de Maio ao Estado Novo. Apesar de ter nascido no concelho de Mirandela, em Trás-os-Montes, onde sua família tinha propriedades, passou a maior parte da vida civil em Portugal na área do Douro Litoral, na Casa da Torre, casa-mãe da família, na freguesia de S. Tiago de Rande, em Felgueiras. Tendo aí vivido as peripécias mais pessoais e afetivas desde sua infância até à juventude, como narra no livro “Memórias do Capitão”, obra prima memorial que foi livro de estudo literário de ensino no Brasil. 
Como aluno da Escola do Exército participou nos movimentos da Rotunda, em Lisboa, ao lado de Machado Santos, nos dias 3 a 5 de Outubro de 1910, de que resultou a implantação da República Portuguesa. Participou nas campanhas do Sul de Angola, esteve na Flandres, durante a I Grande Guerra, foi o herói da derrota da Monarquia do Norte e consequente manutenção da República, em 1919 (…"Mas a breve guerra civil terminou com a entrada das tropas republicanas no Porto, após a revolução de 13 de Fevereiro de Sarmento Pimentel" [...] - José Gomes Ferreira, A memória das palavras.) Cujo movimento vencedor levou a ter sido reconhecido com uma espada de honra dos habitantes da cidade do Porto, pela sua participação nessa revolução de 13 de fevereiro de 1919. Tendo entretanto sido ainda distinguido com medalhas pelas campanhas militares e agraciado com a Ordem da Torre e Espada. Até mais tarde ter estado entre os comandantes da revolta de 1927, no Porto, após cujo desfecho se teve de exilar, fixando residência no Brasil. Ali liderou também a colónia portuguesa de opositores ao regime de Salazar e Caetano, tendo entretanto vindo à Galiza para colaborar numa revolta falhada em 1931. 
De permeio escreveu o livro “Memórias do Capitão”, editado no Brasil em 1962 e que ficou como livro de estudo em universidades brasileiras. Livro que só foi possível publicar em Portugal em 1974, depois, após o 25 de Abril, quando regressou temporariamente para festejar e rever seu país, passados quarenta e sete anos de exílio por motivos políticos. Veio a ser ainda condecorado com a Ordem da Liberdade, na presidência do General Ramalho Eanes. Seu nome foi honrosamente atribuído à Biblioteca Pública de Mirandela e a uma Escola Estadual no bairro de Itaquera, em São Paulo-Brasil. Tendo por fim falecido no Brasil, com uma pneumonia fatal pela noite de 12 para 13 de Outubro de 1987, quase a perfazer 99 anos de idade, junto à prole familiar ali já radicada.

Como no tempo de sua participação nos últimos movimentos revoltosos tinha a patente de capitão, era considerado como “Capitão-comandante”. Mesmo depois de ter sido promovido a General, como foi seu posto distinto, continuou a ser conhecido pelo popular apelido.  

Ora vem a propósito evocar o famoso “Capitão-Comandante” Sarmento Pimentel na ligação ao F C Porto, para registar o facto de constar algo relacionado ao clube na sua correspondência, que tem sido objeto de estudos. Atendendo à digressão que a equipa principal de futebol do F C Porto efetuou ao Brasil em 1956, (após conquista do campeonato português e em trânsito para a primeira participação na taça do Mundialito da Venezuela), sendo que João Sarmento Pimentel, exilado no Brasil desde 1927, era figura de relevo na comunidade portuguesa radicada na metrópole brasileira de São Paulo. Ele que em 1935 fundara a Casa de Portugal, em São Paulo, onde em 1952 foi escolhido como Presidente do Centro Republicano Português. Sabendo o autor, por contactos de amizade (derivado a ele ser conhecido de familiares do autor destas linhas, como conterrâneo de residência em Portugal), que João Sarmento Pimentel nutria simpatia pelo F C Porto, clube da cidade onde ele residiu nos tempos de heroicidade bélica, em que deu voz de prisão aos monárquicos de Couceiro em 1919 e se envolveu na revolta de 1927. Embora sem maior associação por ter saído de Portugal ainda em tempo que o desporto não estava muito desenvolvido socialmente.

(Uma carta, como ilustração de conhecimento pessoal)

Indo ao assunto propriamente, refira-se então que entre a “Correspondência de João Sarmento Pimentel a seu cunhado Fortunato Seara Cardoso”, que era ao tempo diretor d’ O Comércio do Porto, é de reter uma passagem – depois de uma vista de olhos por outras linhas, nos predicados epistolares:

- 1956. Carta de São Paulo, 29 de junho.
(Aludindo chegada de notícias e receção duns livros: ) «Esta vida de agora, mais sedentária, leva-me a mergulhar na leitura. E assim vou iludindo a ausência da terra mater e estas saudades, que são a águia lendária do velho Prometeu, sem esperança de vir outro Hércules libertar-nos do suplício. Aqui os livros portugueses atingem preços astronómicos, demais sendo uma raridade. O governo ainda não se convenceu que o único meio dum intercâmbio eficiente e garantia do predomínio da cultura portuguesa no Brasil, seria uma livraria onde os escritores portugueses estivessem ao alcance da gente remediada. Essa propaganda é substituída por endeusamentos do Estado Novo, parecendo que o passado e o futuro não contam. Nós outros não pensamos assim e ainda agora lembramos à urbs gigantesca o gigante Camões com uma notável exposição bibliográfica das obras do épico na Casa de Portugal e conferências em Santos, São Paulo, Ribeirão Preto e São Carlos. Mandar-lhe-ei oportunamente os opúsculos que registam e atestam essa homenagem à Pátria madrasta e ao seu maior expoente, também em vida por ela abandonado e esquecido». (Muda de conversa para o futebol. A propósito da ida ao Brasil do Futebol Clube do Porto, anota, na mesma carta, dando notícias do Futebol Clube do Porto, referindo ter a embaixada portista passado com atuação fria e friamente recebida pela comunidade lusa em São Paulo, por falta de cortesia na receção e de associações que cultivassem a parte afetiva do intercâmbio.) «A Casa de Portugal não foi procurada, nem recebeu, como de direito, comunicação oficial ou oficiosa da vinda a São Paulo daquele time, pelo que não tomou providências que sempre lhe deram pretexto para mostrar o seu patriotismo, generosidade e boa vontade por todas as atividades que mostram os seus patrícios chegados a Piratininga. E como a Casa de Portugal congrega a melhor gente portuguesa e de maior poder económico, resultou desse alheamento o fracasso financeiro e social da excursão em terras bandeirantes.» (Arquivo Maria Elisa Pérez - conf. estudo da Drª Maria Estela Guedes, para um projeto de livro)


Naturalmente que o caso tem a ver com o facto dos representantes portugueses em São Paulo serem  então contrários à situação política vigente em Portugal, naquele tempo e, como tal, a política portuguesa, através dos canais da censura e redes policiais, vulgo Pide, não terem dado azo a que houvesse o devido contacto. Mais porque o F C Porto nunca foi visto pelo Estado Novo com olhos protetores, nem de grande afeto, aliás. Perpassando assim na colónia lusa, naquele chão brasileiro, alguma frustração de não ter podido render as devidas homenagens à embaixada portista que andou então por aqueles sítios.

Fica assim mais um testemunho de outros tempos. De… In illo Tempore!

Como ilustração, juntam-se algumas imagens sobre o percurso e obras literárias desse português que sentiu o Porto também do outro lado do Atlântico.

ARMANDO PINTO

((( Clicar sobre as imagens, para ampliar )))


Nota Bene: A propósito, confira-se também anterior artigo, 
(clicando)
sobre

A.P.

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