quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Antigo Lar do Jogador do F C Porto


Em período de acalmia de jogos e outras cenas do panorama desportivo, apesar de haver diversos mais temas de interesse e focos de atenção, como os da atualidade, proporcionam sempre estes interlúdios que haja um espaço para curiosidades, entre motivos que despertem atração evocativa.

Em tal apelo, da ideia dum espaço deste género, lembramo-nos de focar a antiga existência do Lar do Jogador do F C Porto, em virtude do que representou no desenvolvimento organizativo tendente à afirmação do futebol do clube. Surgido que foi, inicialmente pelos anos quarenta e depois teve continuidade a meio da década de cinquenta, do século XX, ou seja aquando da passagem para o semi-profissionalismo, dos tempos de Pinga e outros que envergavam a camisola das duas listas azuis do F C Porto, bem como posteriormente na definitiva profissionalização dos futebolistas, no tempo do comando de Yustrich, num dos sinais da evolução que começava a notar-se e tudo o mais que se foi expandindo.

Naturalmente que no presente existe uma outra casa a servir de Lar do F C Porto, a agora chamada Casa do Dragão, apenas que havendo a diferença de esta comportar jovens, destinada que é aos rapazes das categorias de formação; enquanto que a antiga mansão era para os seniores, juntando os que não tinham residência em zonas do Porto e especialmente os solteiros, servindo aos fins de semana para juntar também os casados e por vezes ainda para estágios da totalidade do plantel, embora mais usualmente os convocados para jogos, etc

O assunto dava pano para mangas, de tanto que merece apreciação e considerações, mas precisamente por uma grande abundância descritiva em que se alongaria, cingimos o tema a umas quantas rememorações e privilegiando a ilustração, através de fotografias coevas.  Na linha de que o que se vê, pela figuração, dispensa muita explicação, tal qual a máxima que uma imagem vale por mil palavras.


Ora, o Lar do Jogador inicial teve lugar na chamada Quinta da Fonte da Vinha, no tempo em que estava à frente dos destinos do clube o industrial Sebastião Ferreira Mendes.Num paradisíaco local, propriedade daquele então presidente da Direção, junto ao rio Douro, no concelho de Gaia, para os lados de Oliveira do Douro. Um frondoso espaço ribeirinho que já antes servia para realização de eventos ligados a momentos altos da vivência do F C Porto – como se demonstra por imagem de um postal de 1932, referente a “Passeio fluvial organizado pelo F.C.Porto à Quinta Fonte da Vinha, em homenagem ao seu 1º Grupo de Futebol, Campeão Nacional. Aspecto do desembarque. 14 de Agosto de 1932.”

Pois essa quinta, tendo ficado depois como sítio e casa de passagem de tempo dos futebolistas do F C Porto, passou a ser conhecida por Quinta dos Jogadores, servindo então como local de concentração em determinados períodos e de estágios antecedentes aos jogos, sendo ali que se passou, por exemplo, o célebre episódio ocorrido com uma macaca talismã do Sporting, que resultou a pontos do F C Porto ter vencido de forma concludente o resultado do embate com os leões, que se seguiu (mas que aqui e agora não podemos estar a relembrar, para não nos desviarmos do tema).


Não é verdade, portanto, o que tem sido afirmado, quanto ao Lar haver sido criado por Yustrich, pois já existira antes. Com a vinda daquele treinador brasileiro, que impôs sua chancela de marca, houve sim uma reativação da ideia e reformulação do conceito, passando a ser alargado como residência permanente dos jogadores solteiros que até aí viviam fora do Porto, além de ter ficado em instalações dentro da cidade do Porto, no Bonfim, em casa relativamente próxima ao estádio. Cuja inauguração aconteceu a 21 de Setembro de 1955, na semana seguinte ao início do Campeonato de 1955/56 – acto a que se reporta a imagem cimeira (com legendas manuscritas por José Bacelar, um dos homens de proa dentro do clube nesse tempo), numa cerimónia presidida pelo Dr. Cesário Bonito, no momento em que usava da palavra Afonso Silva. E um dos primeiros utilizadores foi logo Jaburu, o “Flecha negra”, vindo do Brasil e que ganhou grande cartel pela Invicta, sendo a casa aberta curiosamente na véspera do jogo de estreia desse avançado detentor dum grande corpanzil e famoso pelo seu poder de goleador. Como relata um trecho do livro “Glória e Vida”, narrado em trabalho interessante do António Simões d´A Bola:


Dum desses fins de semana de concentração será uma pose, que se mostra de seguida, duma sugestiva descontração de alguns elementos principais do plantel – vendo-se, a partir da esquerda, Gastão, Eleutério, José Maria, depois outro Zé Maria, o Pedroto (de pé), mais Sá Pereira e Hernâni.

Como corolário das estadias anuais, no período das temporadas desportivas, havia no fim de cada época um convívio, antes das férias, metendo jogos de solteiros e casados, entre os que passaram pelo Lar durante o ano. Sendo duma dessas ocasiões a gravura que se junta, com pose da equipa dos solteiros desse tempo, incluindo diferentes gerações, notando que ainda estavam solteiros homens mais velhos como Hernâni, Arcanjo; Pedroto, Virgílio, José Maria, tal qual mais novos como Morais, Sarmento, Correia, Américo, etc.


Passados anos o Lar conheceu outros poisos, entre os quais passou pela Praça das Flores e também pela rua de Costa Cabral, durando até eras adiantadas dos anos sessentas, enquanto os futebolistas foram tendo outras ocupações paralelas. Até que com o profissionalismo integral os estágios passaram a coexistir em pensões e hotéis.

Dessas diversas fases ilustramos um andamento cronológico através de algumas fotos intercaladas ao logo do texto, desde uma roda de amigos à porta da casa comum, ao tempo de Humaitá (e restantes indicados na legenda); seguindo-se um instantâneo de Miguel Arcanjo numa sala de estar do “Lar do Porto”, com seus discos junto a um móvel-aparelho de gira-discos da época, no regresso de uma digressão da equipa; 



 s

..vendo-se, depois, também junto à frontaria do edifício o defesa Almeida, acompanhado de Barrigana (não o guarda-redes, mas um defesa que em meados da década de 60 fez parte do plantel, havendo integrado a equipa principal em torneios e jogos particulares, e oficialmente alinhou pelas reservas); até findar este circuito pelo tempo com Atraca num descanso de guerreiro, passando os olhos por uma publicação, no leito retemperador.



Armando Pinto

»»» Clicar sobre as imagens «««

4 comentários:

  1. Conheci a Casa da Praça das Flores, mas não tenho memória de que antes tivessem existido outras. Tive um amigo portista, que privou com os jogadores que se vêem nas fotos, como Pedroto, Hernâni, Miguel Arcanjo. Alguns deles passaram várias vezes por aqui quando ainda estavam em actividade, como Carlos Vieira, o mais assíduo (não consta das fotos) e, já retirado, Hernâni, que tive o prazer de conhecer na boda da filha do amigo a que acima aludo.

    Era a época em que os jogadores sentiam o clube como os adeptos..

    Abraço.

    ResponderEliminar
  2. Mais um excelente trabalho deste blogue de excelência. Vivi alguns anos na Rua do Amparo e foi aí que a minha irmã conheceu um jogador do FCP com quem mais tarde viria a casar. Brinquei muito nas instalações. O Oratório sempre conservado e com flores, a piscina nunca apareceu, mas a horta lá se manteve. O espaço era humilde e sem luxos, mas permitia aos solteiros e aos estrangeiros um poiso de recolhimento. As refeições, preparadas numa cozinha onde nada faltava, eram bastante divertidas e servidas num enorme salão. Os últimos "administradores" do espaço, um casal extermamente dócil e simpático, que foi viver para VNGaia, junto a Santo Ovídeo, tinham um cão finguelinhas mas mau como as cobras, o "Porto", pois claro, mas que me acompanhava pelos passeios na quinta e me deixava fazer festas. O espaço ficava paredes meias com o Hospital Joaquim Urbano (mais conhecido na altura pelo nome de "goelas de pau" (em Câmara Pestana) e ainda hoje podemos ver parte dos terrenos junto ao túnel que liga a Avª de Fernão de Magalhães. Obrigado pelo reavivar destas memórias...

    ResponderEliminar
  3. Este Barrigana, era defesa direito, sobrinho do antigo guarda-redes também Barrigana. Não chegou a ser titular da primeira equipa porque apanhou ainda com o Virgílio e depois o Festa nos seus bons tempos na posição. Grande artigo, a que não falta nada e vê bem que o Lar já era mais idoso.

    ResponderEliminar
  4. Essa quinta está agora a ser reconvertida num hotel de luxo. Falta saber o que fizeram aos quadros e tanta coisa que lá ficou desde que funcionou como Lar do FCP.

    Também outra ocorrência com essa quinta, esteve relacionada com a compra de Gualter pelo FC Porto ao Guimarães, mas como a transação estava difícil, ele esteve escondido nessa quinta:

    “A época de 1969 estava à porta. A fama de Gualter não se confinava ao reduzido espaço minhoto. Senão atravessava fronteiras, estendia-se no entanto, a outras paragens bem longínquas do nosso Portugal. Chegou, por exemplo, ao Porto e a Lisboa. Emissários azul-branco haviam ido muitas vezes à Cidade-Berço onde tinham tido a oportunidade de apreciar as qualidades do defesa direito do Vitória. Do mesmo modo, gente afecta ao Belenenses, tinha consciência plena da valia de Gualter. Entre esses dois interessados pelos seus serviços o F. C. Porto acabou por levar vantagem.

    Em meados de Agosto desse ano os jornais davam a noticia: Ivo de Araújo, diretor do Departamento de Futebol do clube portuense esteve em Guimarães a tratar da transferência de Gualter. E tendo-se avistado com os dirigentes do Vitória, tomou conhecimento de que estes pediam pela desobriga de jogador a quantia de 1200 contos.

    Foi na época das transferências mais caras registadas no futebol português. Acresce que os portistas deram em troca Bernardo da Velha e isso mais fez valorizar, naturalmente, a transferência do atual defesa azul-branco.

    Havia, no entanto, que preservar o atleta de possíveis desvios para as bandas do Restelo. E o que fizeram os portistas?

    Possuindo o presidente honorário do F. C. Porto, Sebastião Ferreira Mendes, a Quinta Fonte da Vinha, na margem esquerda do rio Douro, em frente a Valbom, verdadeiro oásis nos arredores do Porto, foi para lá que encaminharam Gualter, enquanto os dirigentes do clube ultimavam com os seus colegas do Vitória os pormenores da transferência.
    Quinze dias esteve o jogador nessa Paraíso à beira-rio e, para preencher as horas de ócio de Gualter, Sebastião Ferreira Mendes comprou-lhe uma cana de pesca e uns calções. Não precisava o seu hóspede de sair da quinta para se entreter, posto que o Douro corre lado a alado em direção ao mar numa extensão de algumas centenas de metros.

    Porque nessa quinta se realizavam e ainda inúmeras festas de confraternização oferecidas por Sebastião Ferreira Mendes, quando tal acontecia Gualter era convidado a juntar-se aos criados da casa para passar despercebido dos visitantes:

    - Passei nessa Quinta dias inesquecíveis, pelo carinho que me dispensaram e pela solidão em que vivi. Recordo-me que uma das salas é inteiramente dedicada ao F. C. Porto, com inúmeros quadros e outros objetos relacionados com o meu clube do tempo em que era seu dirigente o Sr. Sebastião Ferreira Mendes.

    Muitos ignoram, certamente, que era ali que estagiavam em véspera de jogos importantes jogadores como Pinga, Valdemar Mota, Siska e tantos mais que são hoje uma saudade.”

    ResponderEliminar