Reconstituição Histórico-documental da Vida do FC Porto em parcelas memoráveis

Reconstituição histórico-documental da Vida do FC Porto em parcelas memoráveis

Criar é fazer existir, dar vida. Recriar é reconstituir. Como a criação e existência deste blogue tende a que tenha vida perene tudo o que eleva a alma portista. E ao recriar-se memórias procuramos fazer algo para que se não esqueça a história, procurando que seja reavivado o facto de terem existido valores memorávais dignos de registo; tal como se cumpra a finalidade de obtenção glorificadora, que levou a haver pessoas vencedoras, campeões conquistadores de justas vitórias, quais acontecimentos merecedores de evocação histórica.

A. P.

sexta-feira, 4 de outubro de 2019

Recordando a notícia da despedida de Américo… em 1969


Para quem começou por conhecer os “jogadores do Porto” pelos cromos de rebuçados, fixando a fisionomia de Américo por essas pequenas gravuras de coleção, era especial mesmo a admiração por quem tão bem “defendia pelo Porto”, depois de tanto ouvir o nome dele pelos relatos, sempre de atenção expetante pelo que saía do rádio que estava junto à cama de minha avozinha (ela paralítica na cama e a sofrer na certa também pela cara do neto enquanto aquilo tudo se desenrolava; e eu que tanto gostava de estar à beira dela a ouvi-la contar-me histórias, nessas ocasiões só tinha cabeça para imaginar ouvindo o que se passava onde os jogadores do Porto andavam).


Ora, sendo especial mesmo essa admiração pelo guarda-redes que tão bem “defendia pelo Porto”, foi com mágoa que, já jovenzinho, depois dele ter defendido à grande na vitória da Taça de Portugal de 1968, soube a meio de 1969 que ele ia ter de acabar a sua carreira. Devido a lesão que não dava para debelar, após ter durante anos superado diversas mazelas sofridas, como destemido guarda-redes que era.

Ora, a notícia chegou pelos jornais. Tendo na ocasião sido a reportagem do jornal A Bola, graças ao bom desempenho do correspondente no Porto desse periódico, que mais sensibilizou a atenção do adepto entusiasta, que era o autor destas linhas também. Sendo a triste notícia difundida na edição de 7 de Junho de 1969, precisamente no dia em que no Porto havia eleições do F C Porto para o biénio de 1969/1970.

Desse número do jornal de Lisboa, ao tempo ainda trissemanário, chegou um destes dias aqui a meus olhos uma imagem, inserta num arquivo de hemeroteca digital, que fez recuar o tempo a esse tempo.


Estava então Américo internado numa clínica médica que havia na Avenida dos Aliados, no Porto. Ainda essa grande avenida era bonita e preenchida, cheia de espaços ajardinados, com árvores e flores a compor o solo atapetado de relva vedada em formas harmoniosas por sebes, etc. e tal. Ou seja ainda não tinha chegado ao coração da cidade os efeitos da cheia de um rio sem água… que meteu água. E foi então à procura da noticia até ali o jornalista portuense d’ A Bola, Justino Lopes. Saindo da escrita desse mestre da narrativa jornalística que “Américo não joga mais…»

Descrevia dali Justino Lopes que tal era notícia com qualquer coisa de dramática, e era realmente. Descrevendo ele que, entrado no quarto 5 (dessa clínica), se lhe deparara o guarda-redes do FC Porto como «um mocetão paciente, curtido nas duras andanças do jogo…» Estando assim «Américo Ferreira Lopes mais a sua perna engessada», que lhe disse: «-Cheguei ao fim». Contando depois que se havia chegado à conclusão de ter de acabar a carreira. Estando ali engessado, por já mais não conseguir, até cair depois de tanto se ter levantado. Recordando e justificando-se: «- Sou de boa carnadura. As minhas recuperações têm causado surpresa aos médicos. “Soldei” um pulso sem gesso num instante. Pois houve um médico que me disse que eram precisos cerca de seis meses para uma pessoa qualquer ficar bom. E pontapés nas canelas, “pitões”, marcados nas pernas…» descrevendo o que levou e aguentou. Resumindo depois que «São as medalhas que levo…».

E assim ali, de perna engessada fora do alvo lençol, Américo afiançava: «-Vim para aqui com vergonha, convencido de que, quando me abrissem o joelho, chegassem os médicos à conclusão de que eu nada tinha que justificasse o golpe. E afinal foi o que se viu. Dizia-se que eu treinava muito com medo de perder o lugar. Mas não era essa a verdade. Treinava muito porque gostava muito de jogar. E ninguém pode jogar bem sem se treinar muito. Uma receita que aconselho aos novos. É uma questão de temperamento? Talvez. A verdade é que nunca me dei bem com manhas. Eu só não me treinava quando não podia de todo em todo. Algumas vezes as amígdalas me atraiçoaram. Mas, afinal, não viriam a ser elas a razão de ser do meu ponto final… Saio como um mártir, mas com a consciência tranquila de que este martírio não é senão fruto da honestidade com que me entreguei ao futebol e ao Futebol Clube do Porto em dezoito anos quase ininterruptos. Estou agora a recordar-me que a paragem mais prolongada foi motivada por uma lesão num cotovelo ocorrida no pelado da CUF. No resto tem sido sempre dedicação ao clube e ao futebol». Acabando por concluir que o futebol para ele foi também um curso de vida, pelas amizades e tudo o que viveu no mundo da bola.


Estava-se então no defeso, acabada que havia sido aquela época em que o FC Porto estivera muito perto de ser campeão, mas não fora… dessa vez mais por outros motivos. E na ocasião em que Justino Lopes anotava a conversa com Américo, apareceram a visitá-lo os novos treinadores da equipa, Schewartz e seu adjunto Vieirinha (tendo depois aquele técnico estrangeiro sido vítima também de doença, que o levou a ter de deixar cedo o lugar), levando o caso a terem ficado na fotografia que teve lugar na capa desse jornal – como acima damos conta, na imagem cimeira.

= Américo como guarda-redes titular na equipa principal do FC Porto, ainda no tempo de Hernâni, Virgílio, Miguel Arcanjo e Carlos Duarte, da geração dourada dos anos cinquentas, e já em transição da era de renovação com ele próprio, mais Custódio Pinto e outros. Foto da época de 1962/63, ultima de Serafim no FC Porto e primeira de Joaquim Jorge com a camisola azul e branca. Reportando a um jogo em que a equipa principal do FC Porto posou junto com a equipa adversária. Dos jogadores do FC Porto pode legendar-se, desde o cimo e a partir da esquerda para a direita: em cima - Hernâni, Serafim, Mesquita, Joaquim Jorge, Arcanjo, Virgílio  e Amérco; em baixo - Carlos Duarte,  Pinto, ...?, e Paula.

Depois disso, volvido algum tempo, antes ainda do início da época seguinte teve lugar uma festa de homenagem e despedida a Américo. Como aqui já descrevemos em anterior oportunidade, aquando da data da respetiva efeméride. 

Tendo então, ao início de setembro de 1969, já com as folhas da natureza a cair, Américo se despedido do futebol como guarda-redes, diante do público das Antas, erguendo os braços ao modo das árvores que morrem de pé.

Armando Pinto

((( Clicar sobre as imagens, para ampliar )))


Nota: Relembrando a festa de despedida acima referida e uma outra ainda anterior também de homenagem, recorde-se (clicando em):

e

A. P.

Sem comentários:

Enviar um comentário