Reconstituição Histórico-documental da Vida do FC Porto em parcelas memoráveis

Reconstituição histórico-documental da Vida do FC Porto em parcelas memoráveis

Criar é fazer existir, dar vida. Recriar é reconstituir. Como a criação e existência deste blogue tende a que tenha vida perene tudo o que eleva a alma portista. E ao recriar-se memórias procuramos fazer algo para que se não esqueça a história, procurando que seja reavivado o facto de terem existido valores memorávais dignos de registo; tal como se cumpra a finalidade de obtenção glorificadora, que levou a haver pessoas vencedoras, campeões conquistadores de justas vitórias, quais acontecimentos merecedores de evocação histórica.

A. P.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Como Pinto da Costa e Pedroto iniciaram sua ligação… segundo testemunho de Alberto Teixeira !

Por um artigo publicado há já uns anos no jornal O Jogo, veio a público uma curiosidade, ao correr duma entrevista com o antigo futebolista Alberto Teixeira, dando para ficar a saber como Pedroto e Pinto da Costa travaram conhecimento pessoal. 

Claro que se deduz que Pinto da Costa eventualmente conheceria Pedroto de leves contactos, ao género de passagem, enquanto diretor das modalidades amadoras do FC Porto que andava pela cidadela desportiva das Antas, além de como adepto o ter visto jogar e treinar quando ele dirigiu a equipa principal do FC Porto durante os primeiros anos da presidência de Afonso Pinto de Magalhães. Mas foi mais tarde, já quando Pedroto saíra do FC Porto e após sua célebre passagem pelo Setúbal, estava a treinar o Boavista, ao tempo que a equipa do Bessa passava o período conhecido por Boavistão, que Pinto da Costa foi apresentado a Pedroto. Sendo que então o defesa Alberto era um dos futebolistas da camisola aos quadrados, também depois de ter estado no FC Porto como júnior e sénior, e por abordagem de seu amigo Jorge Nuno, o apresentou ao treinador José Maria Pedroto.

= Alberto (em baixo, ao lado do guarda-redes) na Equipa Júnior do FC Porto de 1964/65, junto com Pavão (com a bola), Victor Cruz, Rendeiro, Lázaro e tantos outros das Promessas desse tempo

Ora, Alberto Teixeira, defesa central, foi um dos juniores campeões nacionais treinados pelo Mestre Artur Baeta, tendo feito parte da equipa que venceu em 1966 a final de Juniores, através de trunfo por 3-2 sobre o Benfica, em Leiria conquistando o Campeonato Nacional de 1965/1966.

=  Nos Juniores do FC Porto Vice-Campeões Nacionais da categoria em 1964/65. Da “Formação” de jovens futebolistas que sempre teve tradição no FC Porto. Sendo a escola portista uma realidade comprovada, desde tempos distantes, até então já sob auspícios de Artur Baeta, Virgílio Mendes e respetiva equipa...


= Uma das equipas de juniores portistas que jogaram ao longo da época em que o FC Porto venceu o Campeonato Nacional de 1965/66.

Após isso, tendo subido a sénior, fez parte do plantel do FC Porto durante 3 épocas, de 1966/67 a 1968/69, havendo sido utilizado em 5 jogos oficiais de cariz nacional, além de jogos de Reservas da Associação de Futebol do Porto e outras Associações.

= Alberto na Equipa B do F C Porto que venceu a Taça do Norte de Reservas em 1968

Pois «Alberto Teixeira, o defesa central do FC Porto e Boavista que conquistou três Taças de Portugal, ajudou a mudar a face do futebol português ao apresentar José Maria Pedroto a Pinto da Costa…» como foi referido na peça jornalística d’ O Jogo.

Alberto fizera parte dos escalões de formação do futebol do FC Porto, tendo inclusive sido campeão nacional em Juniores. De permeio foi também atleta de hóquei em patins do FC Porto, tendo aí tido oportunidade de se tornar conhecido e amigo de Jorge Nuno Pinto da Costa. Mas o melhor é seguir passo a passo a narrativa que deu a conhecer melhor o caso:

«Estávamos em 1962, a guerra colonial alastrava em Angola. Ele tinha 14 anos e, como de costume, foi ao campo de treino das Antas ver os juniores e os juvenis. Morava perto, na rua Honório de Lima. Só que desta vez, Pinga, então o treinador dos miúdos, reparou nele. Mirou-o de alto a baixo, gostou do que viu e fez a pergunta que lhe mudou a vida: “Queres equipar-te e treinar?” “Eu era alto para a idade”, explica Alberto, que já era um atleta, pois jogava hóquei em patins no Vigorosa, desde os 11 anos. O hóquei era o outro dos seus dois amores, cultivado pelo pai, que o levava a ver a seleção nacional jogar no Palácio de Cristal. Jogava no Vigorosa mas era já portista encartado. O seu herói era Jaburu (“Era um ídolo, a imagem dele saía como brinde no bolo rei. Tinha um remate fortíssimo, foi um dos jogadores que mais me marcou”), o ponta de lança brasileiro que Yustrich trouxe para a equipa do FC Porto campeã nacional em 1955/56 (tinha ele oito anos) e onde alinhavam Pedroto (que viria a ser seu treinador no Porto e Boavista), Hernâni (“uma figura de proa”) e Miguel Arcanjo (“um tipo muito simpático com os miúdos”). Contra a promessa solene de que não iria nunca deixar que o desporto lhe prejudicasse os estudos, o pai, diretor fabril na Raione, fê-lo sócio do FC Porto, habilitando-o assim a ir ver os treinos às Antas. No hóquei, transferiu-se para o FC Porto, onde foi treinado pelo economista e jornalista Correia de Brito e se cruzou com um seccionista que “tinha uma piada fabulosa e tinha uma grande facilidade no relacionamento com as pessoas”, chamado Jorge Nuno Pinto da Costa. Acumulou o hóquei e o futebol até que teve de escolher e o FC Porto o obrigou a descalçar os patins, o que fez com alguma pena.»

= Pedroto, em 1967/68

«Como o pai morreu novo, Alberto tornou-se adulto mais cedo ao ver-se na contingência de ajudar a mãe, que com o seu magro salário de empregada na Companhia dos Telefones tinha de sustentar os quatro filhos e a sogra. “Eu meti na cabeça que era capaz de ser futebolista e continuar a estudar”, conta, acrescentando que ficará para sempre em dívida com o futebol por lhe ter pago os estudos e permitido licenciar-se em Economia. No percurso pelos iniciados, juvenis e juniores – onde Artur Baeta era a alma mater - foi tendo colegas que se tornaram lendas do nosso futebol, como Artur Jorge, que passou a sénior no ano anterior ao dele, e Pavão. “Lembro-me perfeitamente do dia em que ele chegou às Antas, vindo de Chaves e com a fama de ter estado a treinar no Benfica. Estávamos no estádio principal e ele entrou a substituir-me no jogo-treino. Foi como se tivesse chegado alguém do outro mundo. Com ele, a bola parecia mais redonda. Era um jogador tipo Deco, box to box”, recorda Alberto, acrescentando que João Alves foi o único colega de equipa que teve cujo talento se aproximava do de Pavão. Alberto cobriu-se de glória na sua última época como júnior, a de 1965/66. Enquanto os Magriços se preparavam para fazer um brilharete no Mundial de Inglaterra, ele foi campeão nacional e conquistou o Torneio de Limoges, feito rijamente festejado na Baixa do Porto, que se encheu num S. João antecipado. “Na altura a cidade contentava-se com pouco”, refere. Foi “um sonho, uma alegria, uma maravilha” fazer parte daquele reduzidíssimo lote de juniores que foram escolhidos por José Maria Pedroto para ficarem nas Antas no ano em que foram promovidos a seniores. Hernâni era então o responsável pelo departamento de futebol. O presidente era o banqueiro Afonso Pinto de Magalhães. Começou a receber dois mil escudos por mês, o que lhe permitiu logo no segundo ano de profissional, comprar o seu primeiro carro, um Simca 1000, enquanto os estudantes franceses faziam o seu Maio. Tratava por “senhor” os mais velhos. Era senhor Américo para aqui, senhor Custódio Pinto para acolá. Mesmo não sendo titular, era frequentemente convocado.»

= Alberto Teixeira

«Estreou-se a lateral direito (fazia todas as posições na defesa, se bem que central fosse a favorita), a substituir o magriço Festa, num jogo em que o Porto perdeu 2-0 com a Sanjoanense. “O Eusébio era diferente de todos os outros, e o Benfica tinha melhor equipa do que nós – mas era muito favorecido pelas arbitragens. Como não havia televisão, em jogos fora éramos quase sempre roubados”, recorda. A esperteza de Pedroto ajudava a equilibrar um pouco os pratos da balança. “Quem sabia era ele. Organizava muito bem e era inteligente no que fazia. Era aquele tipo de pessoa que teria sucesso em tudo quanto se metesse”.»

= Imagem de um cromo de caderneta de coleção (com impressão desfocada) - Equipa do FC Porto da época 1968/69. De pé da esquerda para a direita: Alberto, Bernardo da Velha, Atraca, Pavão, Valdemar e Américo. Agachados: Lisboa, Djalma, Custódio Pinto, Gomes e Nóbrega.=

«No final da sua terceira época como sénior, após uma digressão a Angola (de onde o FC Porto trouxe Séninho), Alberto foi emprestado ao União de Lamas, que estava na 2.ª Divisão e era dirigido pelo comendador Henrique Amorim, e treinado por Américo. Na época seguinte, 1970/71, volta a ser emprestado, mas desta vez ao Boavista onde voltará a encontrar Pedroto como treinador, conquistará duas Taças de Portugal e um 2º lugar no campeonato. Esteve no Boavista até ao precoce final da sua carreira, com uma parêntesis em Cabora Bassa, Moçambique, em cuja equipa jogou nos tempos deixados livres da sua atividade de oficial de artilharia do exército português. “A tropa ajudou-me muito a crescer”, garante Alberto, que andava pelo Norte de Moçambique, de arma na mão, quando Pavão morreu nas Antas e se deu o 25 de Abril.»

= Nos festejos da conquista da Taça de Portugal do FC Porto em 1968, no regresso da caravana vitoriosa à cidade Invicta!

«Regressou ao Bessa, onde foi treinado por Jimmy, José Maria Pedroto e Mário Wilson (“a diferença entre eles era da água para o vinho”). Não precisa de pensar um segundo sequer para eleger Pedroto como o melhor de todos: “Nós acreditávamos religiosamente em tudo quanto ele nos dizia no balneário. Sabia ver futebol como ninguém. Falou-se muito do 3x3x4 na passagem do Co Adriaanse pelo FC Porto. Mas, quando estávamos a perder nas Antas, o Pedroto já usava esse sistema, mudando o Bernardo da Velha de defesa direito para ponta de lança”. Aos 28 anos acabou o curso de Economia (onde teve como colegas Daniel Bessa e Teixeira dos Santos) e arrumou as botas, não aceitando o convite de Pedroto para regressar ao Porto, onde quebraria o jejum de 19 anos sem títulos. “Tenho para mim que devemos sair enquanto as pessoas nos querem – e não empurrados”, explica. No entanto, antes de arranjar o seu primeiro emprego como economista, dera um valioso contributo para a hegemonia atual dos portistas. 

= Época de Alberto no União de Lamas (que por acaso não ficou nesta foto), em que na mesma equipa estavam também outros ex-jogadores do FC Porto como o guarda-redes Domingos, o defesa Barrigana, mais Ismael, Lázaro, Rui Ernesto, etc, com Américo a treinador (na única época em que o antigo guarda-redes portista exerceu esse cargo técnico, a pedido do clube da sua terra, que conseguiu então salvar da descida da 2ª Divisão Nacional). Antes de Alberto rumar ao Boavista...

Num jogo do Boavista no Estádio do Mar, apareceu lá Pinto da Costa e pediu-lhe para ser apresentado a Pedroto. Alberto explicou ao treinador que Jorge Nuno estava a tentar reerguer o Porto. Os dois homens apertaram as mãos – e foi o início de uma bela amizade que mudou o rumo do nosso futebol.»

Começara a dupla Pedroto-Pinto da Costa. O destino esteve assim presente e juntou, por meio desse portista que mais tarde se tornou cabeça da empresa depois também responsável pelo “catering” em todo o Estádio do Dragão. E aquele primeiro encontro pessoal de Pinto da Costa com Pedroto, dando início a sua confiança amiga, permitiu que se juntassem dois homens que conseguiram nos anos 70 lutar contra o sistema reinante e colocaram o FC Porto no lugar há muito merecido, durante um bom período de tempo. 

 Até (já depois de Pedroto ter falecido) a corrupção ter voltado a reinar a partir da capital do antigo império… como vem acontecendo de há anos a esta parte, novamente, e sucede escandalosamente com o Campeonato da Liga na atualidade, em 2021!

Armando Pinto

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