Reconstituição Histórico-documental da Vida do FC Porto em parcelas memoráveis

Reconstituição histórico-documental da Vida do FC Porto em parcelas memoráveis

Criar é fazer existir, dar vida. Recriar é reconstituir. Como a criação e existência deste blogue tende a que tenha vida perene tudo o que eleva a alma portista. E ao recriar-se memórias procuramos fazer algo para que se não esqueça a história, procurando que seja reavivado o facto de terem existido valores memorávais dignos de registo; tal como se cumpra a finalidade de obtenção glorificadora, que levou a haver pessoas vencedoras, campeões conquistadores de justas vitórias, quais acontecimentos merecedores de evocação histórica.

A. P.

terça-feira, 28 de abril de 2020

Lembrando Barrigana: - No dia em que “fazia anos” o guarda-redes “Mãos de ferro” do FC Porto


A 28 de abril de 1922 nascia em Alcochete, Frederico Barrigana. Um indivíduo bem masculino conforme mais tarde ficou celebrizado, de mãos férreas a agarrar a bola, como guarda-redes destemido do Futebol Clube do Porto.

Esse jovem mancebo, Barrigana, um dia veio para o Porto substituir o guarda-redes Soares dos Reis II (José, irmão do internacional Manuel Soares dos Reis, mais velho). E tinha o mesmo nome de seu pai, Frederico Barrigana, sendo a mãe Maria Gertrudes. Era o terceiro duma prole de quatro rapazes, que quando já ficaram órfãos de pai foram com a mãe morar para a cidade do Montijo. Onde o jovem Barrigana se iniciou no jogo da bola em pleno campo do clube local. Dando nas vistas ainda nos juniores do Unidos do Montijo, subiu aos seniores, em cuja categoria agarrou logo o lugar de guarda-redes das Reservas (equipas B ao tempo) e depressa passou a titular da equipa principal. Depois disso, foi convidado a ir representar o Sporting, quando tinha 20 anos. Esteve três anos a suplente de Azevedo no Sporting e depois, por fim, rumou ao Porto, onde ganhou calo na guarda da baliza portista e mais tarde agarrou o mesmo lugar na seleção nacional, ficando para a história como um dos melhores guarda-redes de sempre que passaram pelos campos e estádios de futebol.


Frederico Barrigana, ou o “mãos de ferro”, como ficou popularizado a partir de assim ter sido chamado por um jornalista francês após um jogo da Seleção Nacional, foi o substituto do sportinguista Azevedo na seleção, depois de o ter encontrado a titular no Sporting. Havia estado antes no clube verde e branco, em que se manteve três épocas, acabando por vir para o FC Porto, que estava à procura de um guarda-redes para colmatar a vaga deixada pela saída do húngaro Béla Andrásik e a entrada de recurso de Soares dos Reis II. Assim Barrigana mudou-se para a cidade do Porto e rapidamente agarrou a titularidade da baliza portista.


A estreia de Barrigana com a camisola dos Dragões aconteceu numa quarta-feira, a 2 de Dezembro de 1943, alinhando ao lado dos craques da época, diante da Sanjoanense, a quem o FC Porto venceu folgadamente por 11-2, em jogo particular. Havia sido iniciado o Campeonato dessa temporada, no domingo anterior. Volvidos três dias da entrada na equipa, era já ele o tiular oficial, jogando a 5 do Dezembro no Campo do Bem-lhe-vai em Guimarães, na estreia em jogos oficiais com o emblema do Porto ao peito, tendo o jogo terminado num empate de 2-2, com o FC Porto reduzido a nove jogadores e inclusive com Pinga a jogar a defesa, na ajuda aos companheiros obrigados a desdobrarem-se, nessa partida a contar para a 2ª jornada do Nacional da época de 1943/44.

Encontrou Barrigana, pois, ainda o consagrado Pinga na equipa, quando entrou na formação principal do FC Porto, em cuja equipa alinhavam também Camilo, Alfredo Pais, Pocas, Maiato, Sárrea, Lourenço, António Araújo, Correia Dias, Gomes da Costa, Catolino, etc.. Tendo depois assistido ao final de carreira do grande Artur de Sousa Pinga. Em tempo que o clube passava por mais uma fase de transição entre gerações de jogadores e de crescimento do clube como instituição sócio-desportiva.


Já com o lugar de guardião do FC Porto bem firme e de fama alargada por vistosas exibições, o então titular no FC Porto, Barrigana, estreou-se pela principal Seleção Nacional a 21 de Março de 1948 (depois de antes ter jogado na secundária Seleção B a 3 de Maio de 1947) e, em tempo de poucos jogos de seleções, foi 12 vezes internacional na Seleção A e 1 na B - entre 1947 a 1954.


Esteve Barrigana durante 13 temporadas ao serviço do F.C. Porto, entre 1943 até 1955, numa era marcada por ausência de conquista de campeonatos nacionais, embora de permeio com célebres jogos internacionais em que o FC Porto conseguia mostrar seu valor, como foi o caso do celebérrimo encontro com o Arsenal de Londres. Enquanto, pelo meio, ajudou o clube da Invicta a conquistar por quatro vezes o Campeonato do Porto e por três vezes a Taça Associação de Futebol do Porto.


Em 1947 recebeu uma oferta do Vasco da Gama, do Brasil, que o queria contratar e lhe oferecia 10 vezes mais do que aquilo que ganhava no Futebol Clube do Porto, mas Barrigana rejeitou e preferiu continuar de Dragão ao peito.


Quem não teve a mesma ideia, mais tarde, foi Yustrich, o treinador que 1955 ao chegar para treinar a equipa portista dispensou o guardião, junto com mais outros valores como Ângelo Carvalho e Porcel, trio que então se mudou para o vizinho Salgueiros. No clube de Paranhos esteve Barrigana ainda durante três temporadas, ajudando o clube a subir de divisão e ali acabou por abandonar a carreira de futebolista em 1958.

Dizia-se popularmente que era um guarda-redes "maluco", no sentido de destemido e desinibido, não apenas dentro do campo. Sendo certo que deixou obviamente a sua marca na história do futebol português. 

= Américo, Vítor Baía, Barrigana e Acúrcio – encontro de quatro grandes nomes da baliza do FC Porto (quando ainda estavam todos vivos, havendo entretanto falecido Barrigana e Acúrcio), representando gerações célebres de guardiões portistas.

António Lobo Antunes até lhe dedicou uma crónica, que ficou famosa e tem sido citada em diversos locais de diversos modos e feitios.

Faz parte esse texto do livro de Crónicas daquele clássico escritor, por acaso até benfiquista, mas admirador do grande guarda-redes do FC Porto. Sendo tal crónica apreciável no cunho literato desse escritor de renome, ainda que algo difícil de ler nalgumas das suas narrativas, enquanto noutras tem partes encantadoras e que fazem escorregar a leitura para lembranças a condizer com coisas de quem estiver a ler. 

Atente-se então na crónica intitulada “O Grande Barrigana”, por Lobo Antunes:

«De há quarenta anos para cá, com entusiasmo, fervor e admiração, vi jogar quase todos os grandes guarda-redes portugueses, do inesquecível Azevedo, "Hércules do Barreiro", a José Pereira, o "Pássaro Azul". Vi o gigantesco Ernesto, do Atlético, o terror dos extremos, vi Abraão, do Olhanense, vi Cesário, do Sporting de Braga, na tarde de glória, no pelado do Benfica, em que defendeu todos os remates de Palmeiro, Arsénio, Águas e Rogério, vi Capela, da Académica, e Sebastião, o loiro Nero do Estoril Praia, célebres pelos seus voos acrobáticos, vi o fantástico Aníbal, de poupa trabalhada a brilhantina, vi o caprichoso Carlos Gomes pontapear fotógrafos antes de se transferir para Espanha e de ameaçar o presidente do clube, quando não lhe pagavam, com a irónica frase 'no hay dinero no hay portero', acompanhei o Vital, do Lusitano de Évora, que sulcava a relva com o calcanhar pensativo da bota, para marcar o centro da baliza….»

(Claro que António Lobo Antunes, como benfiquista e adepto de futebol mais de outros tempos, não conheceu o valor de Américo, por ter sido espetador mais de jogos em campos da zona de Lisboa e Vale do Tejo, onde os do Norte também calhassem de ir em dias dele lá ir… Tendo conhecido Frederico Barrigana melhor já em África, quando esteve na tropa e o Barrigana treinava a miudagem lá onde Lobo Antunes cumpria tempo de tropa.)

«E todavia, para meu desgosto e frustração, nunca assisti a nenhum jogo do meu ídolo Frederico Barrigana, o 'Mãos de Ferro', keeper do FC Porto. No intuito de compensar tal desdita, recortava, embevecido, do jornal, os instantâneos que o mostravam a saltar com um avançado, apertando-lhe contra as partes o joelho dissuasor (porquê partes se não inteiras?), a fim de esfriar os ímpetos assassinos do adversário; admirava-lhe a calvície e o boné que a cobria numa exatidão de cápsula; colecionava-lhe as entrevistas e escutava, boquiaberto, na telefonia do meu pai, de dedos em concha na orelha, os relatos de Artur Agostinho, que, aos domingos, às 3 da tarde, narrava em tom épico, as proezas do grande Frederico Barrigana num estádio a rebentar de público. Aos 12 anos, se eu não desejasse, com tanta paixão, tornar-me escritor, quereria ter sido o "Mãos de Ferro". Mas, claro, possuía o sentido das limitações suficiente para compreender que não se pode querer ser o grande Frederico Barrigana: é-se, por dom divino, perfeito como ele só, desde o início. (…)»


O Mãos de Ferro, Frederico Barrigana, após curta carreira de teinador nalguns clubes, como depois de ainda ter sido treinador de guarda-redes no FC Porto (e por interferência do ao tempo já treinador principal Pedroto ter ficado a receber uma pensão como reconhecimento do FC Porto), morreu no dia 30 de Setembro de 2007 no Hospital de Águeda, vítima de doença pulmonar.

= Barrigana, junto com Pedroto, mais o Prof. Hernâni Gonçalves, António Morais, da equipa técnica  e Pinto da Costa, então Chefe do Departamento de Futebol do FC Porto, bem como alguns amigos, aquando da conquista da Taça de Portugal de 1976/77.  Cujos festejos na ocasião, decorriam no hall de entrada do estádio das Antas, como se nota pelos quadros com fotos de Siska e Pinga, que ali estavam na galeria de figuras históricas do grande clube. 

Armando Pinto
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3 comentários:

  1. Tenho esta Biografia mas com uma particularidade. Assinada pelo Sr. Barrigana em Angeja.no dia 5 de Agosto de 2004 , em casa dele.

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  2. Viva amigo. Não costumo publicar comentários anónimos, mas publiquei este por ver que é com boa intenção. Mas seria bom pelo menos no fim do comentário colocar o nome, para sabermos quem é. Pode ser? Abraço.

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  3. Grande Frederico Barrigana! Convivi com ele muitos anos… Excelente texto! Obrigado
    Nuno Oliveira

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