Corriam tempos de transição das épocas vitoriosas nas décadas
anteriores, sem que nos anos 40 o FC Porto conseguisse no futebol que as
camisolas azuis e brancas chegassem no fim dos campeonatos a sentir o odor da
conquista do título nacional. Sendo nesse ambiente que em fins dessa década
foram chegando ao FC Porto alguns estrangeiros, vindos do outro lado do Atlântico,
para reforçarem a equipa, como foram os casos de Pereyra, Fandiño e outros. Sendo
o caso de Julio Pereyra um caso à parte, passado com esse Argentino que veio do
Brasil, onde jogara entretanto, por ter chegado ainda a jogar com a camisola azul e
branca mas não ter podido assinar contrato e como tal não ter jogado oficialmente
pelo FC Porto, devido a lesão que se intrometeu. Havendo contudo estado então vinculado
ao F C Porto na época 1948/49.
Ora estando presente a vinda de diversos Argentinos para o
FC Porto em tempos recentes e na calha dessa boa onda ter havido oportunidade
de recordar a ilustre galeria de jogadores do país da nação azul celeste, vem a
propósito evocar o caso de Julio Oscar Pereyra, homem do futebol com esse nome
assim escrito, em conformidade ao registo de sua naturalidade.
Com efeito, Julio Pereyra jogou pelo FC Porto, mas só em
jogos particulares. Porque num dos primeiros jogos que chegou a fazer em
Portugal, pelo FC Porto, num encontro contra o Beira-mar partiu um pé e teve uma
lesão bastante grave na virilha esquerda. Resultando desse episódio um
diagnóstico médico indicando que ele nunca mais poderia jogar. O que consequentemente,
com esse estado, levou a que a transferência não fosse concluída, visto que a inscrição
da Confederação Brasileira de Desportos para a Federação Portuguesa de Futebol, ou seja do Brasil, onde ele jogara, para Portugal,
custava na época coisa de 10 contos, quantia assinalável para a época. Então, na dúvida da recuperação, não foi
inscrito. Enquanto de seguida, na negociação para acerto de assinatura de
contrato, foi-lhe proposta redução de salário, ao que havia sido combinado, e ele
não aceitou. Levando isso a ter seguido outro caminho, embora continuando ligado ao futebol, mas por
outras paragens.
Ora, acertando o passo da evocação, neste pé, há que fazer uma retrospetiva
curricular e biográfica, antes e depois dele ter chegado a jogar com a camisola
azul e branca do FC Porto. Segundo informações pessoais do filho, Júlio de Carvalho
Pereyra, a quem reconhecido o autor desta lembrança agradece.
Julio Oscar Pereyra nasceu em Lincoln, Argentina, a 31 de Janeiro
de 1918, sendo o sexto de 7 filhos da prole de sua família. Tendo cedo ficado
órfão de pai aos 7 e de mãe aos 15 anos. Foi então viver para Buenos Aires, em
Avellaneda, em cuja zona do Independiente jogou então nas camadas jovens e
evoluiu até chegar acima. No mesmo clube em que seu irmão, António Pereyra, foi
titular até ter uma fratura de menisco, que na altura não se operava e lhe
acabou com a carreira quando vestia a camisola desse mesmo Independiente de
Buenos Aires. Então Julio evoluiu como sénior jogando no Club Excursionistas, no All Boys e no Estudantes de Buenos Aires, bem como esteve para se vincular ao San
Lourenzo de Almagro, mas não chegou a acordo. Entretanto foi 2 vezes
internacional pela Seleção B da Argentina. Jogou depois no União Espanhola, do
Chile, no Wanderers, do Uruguai, rumando de seguida ao Brasil, onde jogou no América
do Rio, Esporte Clube Bahia e Santa Cruz do Recife. E veio depois para o FC Porto, em Portugal.
Veio por fim para a Europa, oriundo do Brasil, após quatro épocas anteriores de outros tantos êxitos. Vindo com destino ao Roma, cuja rota acabou alterada devido a dificuldades surgidas para arranjar bilhete de passagem e por isso teve de vir num cargueiro que também transportava passageiros. O que levou a passar por Portugal, originando alteração de planos e destino. Pois quando chegou, como já era tarde para o respetivo ingresso no clube italiano, com as competições em andamento e porque o clube romano deixara de estar interessado, ele ainda pensou seguir para Espanha, mas mais uma vez houve troca de voltas ao destino. Acontecendo entretanto, que acabando por deslocar-se com o compatriota Scopelli a Lisboa, foi apresentado ao Belenenses e no Restelo fez um treino, havendo chegado a receber oferta de contrato, mas outro rumo acabaria por tomar, também dessa vez.
Entretanto dera-se o ingresso do treinador Alejandro Scopelli no FC Porto, o que fez que o treinador
que estava ligado à sua vinda para Portugal levasse a que afinal Pereyra ficasse no
Porto, também. E de azul e branco ele jogou com Barrigana, Virgílio, Fandiño, Manuel
Sanfins e demais que raspavam as chuteiras de travessas pelo pelado do campo da
Constituição. E outros campos onde jogasse a equipa escalada por Scopelli. Até
que aconteceu a grave lesão num desses jogos. E seguidamente, enquando não
chegou a acordo para continuar no Porto, teve um convite do Málaga, mas algo
mais aconteceu, tendo o colega de equipa Sanfins o convencido a ingressar na
Ovarense como jogador-treinador, de modo a continuar em Portugal. Ai foi então campeão
nacional da 3ª divisão. Cujo primeiro sucesso originou ter enveredado pela
carreira de treinador, definitivamente.
= Com a taça de Campeão da III Divisão Nacional de 1949/50.
Entretanto frequentou um Curso de Treinadores levado a cabo
na Associação de Futebol do Porto, dirigido por Cândido de Oliveira e Pinga, em
que também participaram Pedroto, Joaquim Machado e Porcel, antigos
futebolistas do FC Porto, com José Maria Pedroto a assimilar aí as bases que o
levaram mais tarde a ser o grande Mestre Pedroto. De cujo decurso dos trabalhos e evolução
em campo, desse curso, ficou um instantâneo duma das aulas e uma pose de conjunto para a
posteridade.
Seguidamente, já sentado no banco dos responsáveis como treinador, ficou
ainda na Associação Desportiva Ovarense, e a partir dali seguiu percurso
profissional que o levou até ao Salgueiros, de novo à A.D.O (Ovarense) por
diversas vezes intercaladas, de permeio com passagens por F.C. Avintes (também
mais que uma vez), Sanjoanense, Avintes, Leça F.C., Vilanovense, de novo Salgueiros, depois Feirense, A.C. Marinhense, Leça F.C., S.C. de Vila Real, C.D. de Torres Novas,
Sporting de Braga, Vianense, União de Lamas, C.D. Oliveirense, Sporting da
Covilhã, C.D. Portalegrense, C.D. de Paços de Brandão, Sport Viseu e Benfica,
C.D. de Estarreja, C.D. de Paços de Brandão e S.C. de Mirandela.
Julio Oscar Pereyra, além de ter sido um exímio praticante
de futebol e ainda também de basquetebol, tinha um dom natural, que era de ser
dotado de boas mãos para recuperação de traumatismos físicos, um mister
particular que exercia por carolice, sem querer receber nada. Dom esse que teve
sequência numa neta que, segundo testemunhos, é herdeira do avô nessa qualidade,
além de ser adepta do clube que o avô representou primeiro em Portugal.
Julio Pereyra faleceu em Julho de 1982 vítima de um acidente
de viação, quando já tinha chegado a acordo com a A.D.O. para a época 1982/83.
O autor dedica este artigo e a evocação da memória de Julio Oscar
Pereyra a sua neta Alexandra Pereyra, Portista ferrenha e nascida no Porto, que
embora não tenha conhecido o avô paterno, é uma sua grande fã. Conforme confidenciou
seu pai, que devido ao percurso do progenitor ficou com outra simpatia clubista,
enquanto a filha teve e tem melhores gostos e honra bem a memória de quem originou a
história da família que ganhou raízes em Portugal, a partir do Porto.
Armando Pinto
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